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quarta-feira, 13 de outubro de 2021

O Pelourinho de Cabo Frio: um dos poucos remanescente do período colonial

 

No império ultramarino português a partir do século XV, era muito comum a figura de um Pelourinho, apesar de seu uso remeter a antiguidade clássica. Inicialmente chamado de picota, e sendo chamado de Pelourinho somente no século XVII, segundo o historiador Alexandre Herculano.

Segundo a escritora Rose Fernandes:

O Pelourinho de Cabo Frio é o símbolo do poder colonial português, um dos poucos que ainda restam no Brasil. Por ter sido local de exposição de decretos, leis régias e castigo público para infratores da lei, após a independência do Brasil a população investiu contra os pelourinhos, derrubando-os, destruindo-os, numa manifestação de revolta contra a tirania e opressão do poder colonial.

O pelourinho ainda está associado a um instrumento de tortura, suplício, mutilação e castigo de escravos. Na realidade, ele é o marco que simbolizava a instauração de um núcleo legal, através da ordem régia, expedida pela coroa portuguesa, concedendo às populações autonomia administrativa e poder judicial, elevando-as à categoria de vila. O pelourinho distinguia com certos privilégios, as cidades e vilas que o possuíam.

Hoje, vemos a necessidade de preservação desse objeto, aparentemente simples, mas de monumental resquício da história colonial brasileira. (Fernandes, 2011, p. 51).

 

O Pelourinho é uma coluna de pedra cilíndrica colocada num lugar público de uma cidade ou vila, nele afixavam-se os editais da Câmara e expunham-se às vistas do povo os criminosos que deveriam ser castigados. Além dos malfeitores, eram também expostos e castigados nos pelourinhos os escravos rebeldes, os vendedores que enganavam a população em relação a pesos e medidas e os homossexuais, inclusive se improvisava nos Navios os chamados Pelourinhos, para a Pena e/ou Pecado.

A justiça dos conselhos aplicava penas como multas em dinheiro, desterro, pena de morte, exposição dos infratores acorrentados ao pelourinho com açoites e mutilações.

Além das cidades e vilas de Portugal e do Brasil, também tinham direito a pelourinho os grandes donatários, os bispos, os cabidos e os mosteiros, como prova e instrumento da jurisdição feudal.

Os historiadores não são unânimes sobre a origem dos pelourinhos. Mas para os especialistas Alexandre Herculano e Teófilo Braga, os pelourinhos tiveram origem na columna moenia romana que distinguia com certos privilégios as cidades que os possuíam.

Os Pelourinhos do Brasil e, especialmente, os das cidades portuguesas, são dotadas de notável valor estético e artístico. Os estilos mais comuns encontrados em Portugal são o românico e o gótico (renascentista).

Os pelourinhos, normalmente, são constituídos por uma base sobre a qual assenta uma coluna ou fuste, terminando por um capitel. Em alguns pelourinhos, em vez da base construída pelo homem, eram aproveitados afloramentos naturais.

No Brasil, os primeiros pelourinhos foram erigidos no período colonial, como por exemplo, o de Cabo Frio, que é do século XVII. Inúmeras cidades brasileiras ergueram suas picotas nesse período. O primeiro erigido no Brasil foi na Bahia, em 1558, quando Mem de Sá fundou a cidade de Salvador. Infelizmente esse e tantos outros pelourinhos não existem mais, o que restou foi o nome de uma quadra de terra que ele batizou no centro da capital baiana, que é um dos locais mais visitados do Estado.

Consoante o acabamento do pelourinho, eles podem classificar-se em:

Pelourinhos de gaiola

Pelourinhos de roca

Pelourinhos de pinha

Pelourinhos de coluço (gaiola fechada)

Pelourinhos de tabuleiro (gaiola com colunelos)

Pelourinhos de chaparasa

Pelourinhos de bola

Pelourinhos tipo bragançano

Pelourinhos extravagantes (de características invulgares).

O pelourinho de Cabo Frio se encontrava em frente à Igreja Matriz Nossa Senhora da Assunção, na Praça Porto Rocha, centro da cidade, segundo Beranger (1989). “Quando foi levantado no município não se sabe; sabe-se que, logo um lugar era elevado à vila, erguia-se um”. Vale ressaltar que Cabo Frio surge com status de cidade em 1615, não sendo, como era de costume, passar primeiro pela condição de vila.

Wenerck; Leite (1994) datam o pelourinho da década de 1660.

Em mapa do século XVII, que o historiador Pierre de Cristo disponibilizou nas Redes Sociais, está marcada a localização do Pelourinho, na Antiga Praça da Matriz, hoje Porto Rocha.



Em 1830 e 1833 houve duas propostas na Câmara Municipal para destruição do objeto de tortura que tanto lembrava o passado colonial brasileiro. Pois os liberais em todo o país, nesse período, o consideravam-no um símbolo da tirania e como objeto de vergonha.

Primeiro foi o vereador Pereira Guimarães que, em 1830, requereu a demolição do Pelourinho por estar “embaraçando a praça e não ter uso para a Câmara presente”. Depois foi a vez do vereador Alexandre Manoel de Araújo Porto que, em 20 de abril de 1833, fez um discurso memorável contra o Pelourinho:

Senhores, entre os instrumentos tão amiúde empregados pelos tiranos para flagelo da humanidade, está sem dúvida o pelourinho, e os suplícios para que ele empregava-se, estão entre nós acabados, e acabados para sempre. No país da liberdade, nas terras americanas, já não podem achar leis sanguinárias e ultrajantes para o homem. E assim para que conservar na Praça Pública o horroroso aspecto de um pelourinho, de uma coluna das que sustentavam o governo, metropolitano, de dolorosa recordação? A Câmara Municipal do Rio de Janeiro foi solícita em demolir de pronto o monumento de sangue e de vergonha. E é, na verdade, para se lastimar que a passada Câmara deste município que em si encerrava homens livres e filantropos, não houvesse seguido aquele exemplo, e nos legassem ainda o patíbulo que tanto enfeita a Praça da Matriz essa cidade. Por isso, senhores, se ela ainda não o fez, façamo-lo nós, aprecemo-nos em destruir para sempre aquele instrumento de crueldade, hoje inútil no Brasil.[1]

 

O vereador Rocha pede, então, a palavra e assevera: “Se uma lei é quem mandava levantar aquele monumento, está persuadido que só outra poderia mandar demolir”. Os vereadores decidem consultar o Governo Imperial, que em portaria do Estado dos Negócios do Império, datada de 25 de junho de 1883, em nome do Imperador, declarava que deveria ser conservado o pelourinho, enquanto por alguma deliberação do poder legislativo não fosse mandado destruir todos os que existissem no Império.

No ano de 1865, a Câmara municipal da cidade de Cabo Frio, recebe uma portaria ordenando que, esta, informe depressa “se ainda há pelourinho neste município, onde estão colocados, e qual o uso que dele se faz[2]”. A Câmara delibera que a comissão de redação responda negativamente.

O Pelourinho esteve exposto nos jardins da Casa dos 500 anos de História, no Bairro Portinho, em Cabo Frio, até o fechamento da casa em 2005, sendo transferido para o Charitas, local onde permanece. Ele foi tombado pelo governo municipal em 28 de novembro de 1989, através do Decreto nº 013.

Além do Pelourinho de Cabo Frio outros poucos municípios ainda possuem um, apesar de que a maioria foi destruído. Os estados que ainda podemos encontrá-los são: 

Paraná, Pelourinho de Paranaguá;

Maranhão, Pelourinho de Alcântara;

Minas Gerais, Pelourinho de Mariana, reconstruído em 1970;

Pará, Pelourinho de Óbidos, localizado na praça central da cidade

Pelourinho de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, que está localizado no centro histórico da cidade, onde atualmente é o mercado de peixe.

 



 

 

 



[1] Citado de Beranger (1989, p. 73).

[2]Citação extraído do blog da “Casa dos 500 anos de História de Cabo Frio”. http://casa500anosdehistoriadecabofrio.blogspot.com.br/2010/04/pelourinho-o-pelourinho-sabe-se-que.html.

terça-feira, 24 de agosto de 2021

Não se politiza tragédias humanitárias e nem a dor alheia

 

Tenho visto centenas de posts nas redes sociais especialmente sobre a retomada de poder do Talibã e a saída desastrosa dos norte-americanos do Afeganistão. Mas, o que me incomoda nessas postagens é que elas não possuem o mínimo de preocupação humanitária: são, simplesmente, de cunho político e fanatismo ideológico. 

Se as pessoas que estão postando e fazendo política sobre o Afeganistão tivessem um mínimo de humanidade estariam dando ênfase, também, ao atentado e ao assassinato contra o presidente do Haiti, Jovenel Moise, e mais um grandioso terremoto que matou centenas de pessoas no país. Esse segundo episódio ocorreu na mesma semana da saída norte-americana do território afegão. 

Se fosse preocupação humanitária estariam preocupados com a interminável guerra na Síria que teve início em 2011 que, em 10 anos, nunca cessou e matou mais de 500 mil pessoas, a maioria civis. 

Cadê a preocupação humanitária com os 15 milhões de desempregados no Brasil? Com as nossas gritantes desigualdades sociais? Com a vexatória concentração de renda que deixa à míngua nosso povo sofrido e desalentado? 

Mas, os discursos dos desumanos politiqueiros tem por base a falácia de que o Brasil se tornará, no futuro, um Afeganistão, demonstrando, assim, um claro desconhecimento histórico e social sobre as duas nações, ou seja, a trajetória do Brasil – ex-colônia portuguesa e o maior país católico do mundo – e do Afeganistão – país localizado no Oriente Médio, de maioria absoluta islâmica e imerso em guerra há décadas desde a Guerra Fria, quando pertencia ao grupo de países com influência da antiga União Soviética.  

Esses discursos também querem culpar Joe Biden, o atual presidente dos EUA, se esquecendo ou não sabendo, claramente, que quem assinou o acordo da retirada norte-americana do Afeganistão foi Donald Trump, em 2020, acordo este assinado com o Talibã em Doha, no Catar. 

Deixo claro que as motivações dos discursos políticos envolvendo o Afeganistão, advém do fanatismo político, com altas doses de preconceito, desconhecimento histórico e escassez de humanidade. 

Não se politiza a tragédia humana. Não se politiza a dor alheia. Não se ideologiza o sofrimento humano.  

Que não sejamos insensíveis e inertes ao sofrimento humano e, muito menos, o usaremos com fim político-ideológico!

Respeite a vida. Solidarize-se com outros povos. Sensibilize-se com as tragédias que acometem a humanidade de tempos em tempos. Atualize o significado de compaixão em sua vida.   

sexta-feira, 20 de agosto de 2021

O desespero e a dor dos afegãos e a nossa empatia

Por Acioli Junior*

Estamos assistindo uma tragédia humanitária no Afeganistão. Tragédia esta que afetará, em cheio, principalmente mulheres e crianças.
 
Mulheres que, até ontem, trabalhavam, estudavam e possuíam um mínimo de liberdade de expressão, a partir de hoje, não terão mais esse direito básico: voltarão a andar de burca cobrindo seus olhos, só poderão sair de casa acompanhada por um homem e, se não cumprirem a ordem dos fundamentalistas do Talibã, poderão ser queimadas com ácido ou serem mortas sem nenhuma cerimônia ou compaixão.
 
A Sharia – lei islâmica extremista – será a base da ordem do sistema político e social trazendo opressão, falta de liberdade e fanatismo religioso.
 
A população afegã está desesperada, tentando fugir do país e encontrar abrigo em nações vizinhas. Estradas e aeroportos lotados com mulheres, crianças e idosos fugindo da nova realidade e da vingança dos Talibãs que ficaram 20 anos fora do poder, desde a expulsão pelas tropas norte-americanas, em 2001.
 
O desespero foi tamanho que pessoas se agarraram a partes do avião americano que abandonava o país e caíram a muitos metros de altura. Essas pessoas preferiram a exposição à morte do que viver sobre o jugo de extremistas fanáticos.
 
O mundo todo assiste, consternado, inerte e imóvel a destruição de um povo e a decadência de uma nação.
 
Triste é constatar que a Organização das Nações Unidas (ONU), os EUA, inúmeras potências europeias e outros países que poderiam ajudar a diminuir a dor e a aflição do povo afegão, simplesmente assistem, de braços cruzados e sem a menor empatia, a tragédia populacional.
 
Sempre gosto de ressaltar que “o oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença”. Quando a dor do outro não nos sensibiliza e nos move à prática do bem, somos semelhantes às bestas-feras ou a um ente inanimado como uma pedra, impermeável e impassível ao clamor alheio.
 
Devemos cultivar a compaixão, que era o sentimento que movia Jesus e que o impulsionava a amparar e remediar a dor daqueles que sofriam.
 
Compaixão é se colocar no lugar do outro. É se importar. É sentir a dor alheia. É sentir a tragédia pessoal ou coletiva de outrem, acompanhado do desejo de minorá-la. Também é a participação espiritual na infelicidade alheia que suscita um impulso altruísta de ternura para com o sofredor.
 
Mesmo quando seres pequenos, como nós, relés mortais, sem poder político e grande influência considerarmos que nada podemos fazer pelo povo sofrido afegão, precisamos lembrar que devemos fazer, pelo menos, uma oração e súplica por eles, espalhar, nas redes sociais, a dor e o desespero daquela população e conclamar outras pessoas a também orarem, se possível doarem para minimizar o sofrimento daqueles nossos irmãos.
 
Sempre há a possibilidade de fazer algo no tocante ao próximo, por mínimo que seja; o que não podemos é nos mantermos inertes.
 
Não sentir a dor do outro e não ser tocado pela tragédia de nossos semelhantes é prova cabal de nossa insensibilidade, mediocridade e desumanidade.
 

 
*Acioli Junior é professor das redes públicas e privada de ensino. Possui quatro graduações, sendo três Licenciaturas (História, Geografia e Filosofia), uma graduação como Tecnólogo, no curso de Tecnologia em Gestão Ambiental, e escritor.

domingo, 11 de julho de 2021

Nada mais hipócrita que a justiça aparente[1]

 


A política gera paixões avassaladoras. Tanto a determinado partido ou candidato preferido. Como a ideologia que a pessoa diz abraçar.

Por conta da atitude apaixonada descrita acima, os cidadãos tendem a condenar entusiasticamente os que eles elegem como inimigos políticos ou ideológicos e serem extremamente misericordiosos e complacentes com sua sigla partidária preferencial ou seus políticos queridos.

Vejo todos os dias nas redes sociais, em conversas com grupos de amigos e em publicações em Revistas e Jornais tais atitudes. Proteção a alguns e perseguição a outros. Misericórdia a uns e punição exacerbadas a outros. Amor a uns e ódio gratuito a outros.

Dito isso, venho questionar determinados comportamentos, sobretudo, os que se referem à corrupção, improbidade administrativa e assalto ao erário público.

Em primeiro lugar, questiono a seletividade no ataque à corrupção. O antipetismo exacerbado pela grande mídia e pelas redes sociais, só para citar um exemplo, deveria nos fazer perguntar se o ódio destilado por parte substancial da população é contra a corrupção ou ao PT. Por que a corrupção do partido dos trabalhadores gera tanta indignação e a do MDB, DEM, PSDB, PSL e outros não incomodam? Por que a prisão do Lula gerou tanto prazer em milhões de pessoas, mas a prisão de Eduardo Cunha e de outros políticos não? Por que a possível soltura do Lula leva milhões a ficarem indignados, mas a permanência de Michel Temer, Aécio Neves e Romero Juca soltos não incomodam a maioria absoluta da população brasileira? Por que aqueles que vociferam contra a corrupção petista não reclamaram da Privataria Tucana (que vendeu corruptamente mais de 70 estatais a preço de banana), do laranjal do PSL e da eterna corrupção do MDB, o maior câncer da história política do Brasil? Mais ainda, por que os cidadãos de bem, os que gritavam que "bandido bom é bandido morto" não se incomodaram com o envolvimento do Flávio Bolsonaro com as milícias, com esquemas de “rachadinhas” e por ele pedir várias vezes à justiça para não o investigar[2]?

Ser contra a corrupção é ser contra a todo e qualquer ato ilícito, independente de quem o tenha praticado, independente da ideologia que o criminoso defenda ou de qual partido ele esteja filiado. Por isso, Victor Hugo dizia: "A primeira igualdade é a justiça". E o Artigo 5° no seu caput diz: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza..."

Tão vergonhosa e nefasta quanto um sistema de justiça seletivo é a seletividade de cada um de nós em relação aos praticantes de atos ilícitos. A justiça de uma nação ou de cada ser humano deve ser abrangente a todos. Sem preferência. Sem exceções. Sem partidarismo. Sem perseguições a uns em detrimento de outros.

A justiça de muitos nada mais é que trapo de imundícia. Querer punição severa de alguns e não investigação, apuração e julgamento de outros, é algo extremamente vil.

Quantos milhões de brasileiros acharam normal o julgamento relâmpago de Lula em duas instâncias para que ele não concorresse ao pleito presidencial de 2018, enquanto hipocritamente nunca se incomodaram que dezenas de políticos tenham seus crimes prescritos, pois houve demora demais em seus julgamentos, a ponto de se perder o prazo de punibilidade. Como ocorreu mais de uma vez com os delitos de Jader Barbalho, José Sarney, Renan Calheiros e dezenas de outros corruptos. Se você acha normal que uns sejam julgados com extrema celeridade, enquanto a prescrição de crimes cometidos por políticos sempre foi a regra, você não é contra a corrupção, muito menos possui senso de justiça.

Devemos querer eu e você a mesma celeridade ocorrida no caso Lula para todos os casos de envolvimento de políticos em atos escusos.

Justiça aparente não é e nunca foi justiça. Justiça para ser justiça tem que ser abrangente. Com julgamento justo, com direito à ampla defesa e a um juiz imparcial.

Eu espero de mim mesmo que jamais caia no ardil político-ideológico: desejar ardentemente a condenação de uns, mesmo estes sendo possivelmente inocentes, enquanto desejo que culpados com quem simpatizo andem livremente.

Só para os que anseiam que a justiça prevaleça sobre todos, cabe a máxima de Jesus no Sermão da Montanha: "Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, pois eles serão fartos".

 




[1] Texto escrito em 14/08/2019, com intuito de chamar atenção para aqueles que falam somente de justiça contra seus adversários políticos, enquanto acobertam e não falam dos crimes de seus bandidos de estimação. Ou eu clamo por justiça para todos ou a minha suposta justiça é trapo de imundícia.

[2] Flávio Bolsonaro pediu em 16 de abril de 2020 pela décima vez para a Justiça não o investigar e para que seus sigilos bancários e fiscais não sejam quebrados.

Uma palavra sobre a Reforma da Previdência[1]

 


Vejo pessoas fazendo uma guerra ideológica sobre a questão da Reforma da Previdência Social. Pessoas que de fato não conhecem nem as ideologias que supostamente defendem, muito menos como funciona a Previdência Social do Brasil, quais são suas fontes de receita, quais são seus principais devedores e por que os mesmos não são cobrados.

A verdade é: Ser contra uma Reforma na Previdência é uma ignorância. Ser a favor da Reforma proposta por Bolsonaro e Paulo Guedes é ser desumano!

O que tenho percebido é pessoas que se dizem ou se entendem como de Esquerda dizerem não à Reforma, como se a Previdência não necessitasse de uma mudança ou melhoria substancial. Ela necessita: é urgente e fundamental que ocorra.

Assim como vejo pessoas de Direita ou aqueles que votaram em Bolsonaro, que querem por teimosia, cinismo, ignorância (não conhecem o texto da Reforma e as implicações da mesma na vida da população) por pura maldade ou aversão aos mais pobres que se aprovem o texto proposto por Paulo Guedes e pelo governo do PSL.

O interessante nesse aspecto e preciso ressaltar é que o atual presidente até ano passado era contra e achava desumana a proposta de Reforma da Previdência proposta por Temer, muito parecida com a que ele hoje propõe. Bolsonaro chegou a dizer que o texto que o ex-presidente propunha era uma desumanidade e desrespeito à vida humana e aos trabalhadores brasileiros. Seus filhos, Flávio Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro também criticaram com veemência o texto outrora proposto. Eduardo chegou a dizer que enquanto o governo não cobrasse os grandes devedores da Previdência Social[2] (com a lista deles em suas mãos), o governo não teria moral para mandar tal projeto para apreciação do Congresso.

O exposto no parágrafo acima só me faz lembrar do ditado que diz: "Quer conhecer um homem, dê poder a ele". Infelizmente o poder revela quão vil e demagogos são os seres humanos, sobretudo, os políticos.

Portanto, nunca devemos negar necessidade premente de uma Reforma da Previdência que tire privilégios das elites: políticos, magistrados, pensão de filhas adultas de militares, membros do MP e da Defensoria Pública. E que mantenha o direito dos menos favorecidos: aqueles que deram seu sangue, sua saúde e seu vigor honestamente e que recebem uma aposentadoria indigna, que infelizmente não cobre nem os custos de seus remédios.

Uma casa velha precisa ser reformada (a Previdência Social). Eu não concordo é com o Projeto dos Engenheiros (Bolsonaro e Guedes).


 



[1] Escrito a menos de um mês da votação da Reforma da Previdência Social na Câmara dos Deputados, com a finalidade de mostrar tanto a necessidade de uma Reforma, como uma denúncia da que foi proposta por Paulo Guedes e Bolsonaro. Texto de 15/04/2019.

Sérgio Moro: de herói nacional a juiz iníquo[1]

 

“A cada dia que passa aquele que poderia e deveria ser o herói do Brasil deixa um legado triste de juiz seletivo e iníquo!”

 

Eu sou muito grato ao trabalho inicialmente desenvolvido por Sérgio Moro. Colocar inúmeros bandidos do colarinho branco atrás das grades num país em que a justiça e a legislação penal foram feitas para punir somente negros, pobres e favelados não é trabalho fácil.

Sempre vibrei com as sentenças condenatórias que os juízes Moro e Bretas davam a políticos e empreiteiros bilionários.

Custei a acreditar que tanto Moro como os procuradores da Lava-Jato eram seletivos tanto na sentença que davam como nas investigações que faziam. Discuti muito com amigos petistas que faziam uma campanha vexatória e difamatória deles, sobretudo, para protegerem Lula e seus bandidos de estimação. Como nunca fui filiado a partidos políticos e sempre encarei a corrupção como um câncer ambidestro e pluripartidário, recusei-me a cair nesse jogo de criticar quem combate à corrupção e prende criminosos por paixão ideológica e partidária. Para mim, não há nada mais digno e mais sublime que o combate sistemático à corrupção!

Portanto, nunca aceitei nem aceitarei a desculpa dada por muitos de que a Lava-Jato gerou desemprego "quebrando" as poderosas empreiteiras e levando milhares de trabalhadores a perderem seus postos de trabalho. Para mim, a Odebrecht, OAS, a Queiroz Galvão, dentre outras organizações criminosas, nem deveriam existir, por servirem como instrumento de roubo de quase um trilhão ao povo brasileiro e à nação.

Nunca aceitarei um argumento contra aqueles que atacam a corrupção e o crime, que não seja plausível, coerente e justo.

O que não pode ser negado é que o Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol são pessoas extremamente vaidosas. A vaidade não só cobra um preço alto como corrompe os seres humanos com extrema facilidade.

Eu percebi que no caso de Eduardo Cunha, o parlamentar só foi preso por conta da extrema exposição no caso do impeachment da Dilma, pois foi ele quem aceitou o pedido, como prerrogativa de seu cargo de presidente da Câmara dos Deputados. Entendi então que Sérgio Moro era seletivo e tinha lado.

Ao condenar Cunha, ajudado até pelo Ministério Público suíço que trouxe inúmeras provas, e absolver sua esposa Claudia Cruz, que tinha milhões de reais de propina em sua conta, Moro colocou em suspeita a sua atuação. Tanto é que o MP recorreu da sentença. E agora, com as mensagens divulgadas pelo Intercept, através das quais ficamos sabendo que ele convenceu os procuradores a não levar computadores e celulares do Cunha, ficou claro que ele não era tão sério e incorruptível como achávamos.

No caso Lula e em outros envolvendo líderes do PT, notou-se a predisposição em condenar e a agilidade processual e condenatória, enquanto em outros casos envolvendo outros políticos de outros partidos não foi percebida a mesma vontade condenatória e tamanha agilidade nos processos. Mesmo antes das divulgações das mensagens pelo Intercept, inúmeros juristas já haviam questionado a agilidade processual e a própria sentença que condenou o ex-presidente Lula. Para muitos e para mim, a condenação se baseou mais em convicções do que em provas nos autos do processo. E o jornalista Glenn Greenwald nos revelou pelas conversas que o próprio procurador Dallagnol disse a Moro estar preocupado porque as provas contra Lula eram frágeis.

A aceitação de Moro em ser ministro da Justiça de Jair Bolsonaro e também da promessa de receber uma cadeira no STF, inflamando sua vaidade, foram péssimas para sua reputação e carreira. Pelo menos no que tange a sua imparcialidade e neutralidade como juiz, pois é antiético e indecoroso se condenar o adversário político de uma pessoa e depois trabalhar e aceitar dela promessa de cargo. Moro condenou quem seria o presidente do Brasil em tempo recorde e sem provas cabais e ainda foi trabalhar para o maior beneficiário de sua prisão.

Hoje, Moro, que fez uma escolha desastrosa por conta de sua extrema vaidade e sonho de ir ao Supremo, vive a sofrer e a aguentar humilhações, uma vez que vários da cúpula ministerial de Jair Bolsonaro são denunciados por crimes, inclusive o seu partido é investigado por candidaturas laranjas e o filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro, é investigado por inúmeros crimes além do envolvimento com milícias no Rio de Janeiro.

Deixar de ser juiz e aceitar um cargo político de Ministro da Justiça, de um presidente que quer a todo custo livrar a barra do filho criminoso e que pode demiti-lo a hora que bem entender, é algo extremamente difícil e até humilhante. Por isso, Fábio Pannunzio disse hoje: "E aí, Moro? Admiro sua capacidade de suportar humilhação imposta por Bolsonaro. Enquanto ele te destrói, você fica calado esperando a hora de levar um pé na bunda. Perdeu o STF, o COAF, a ILONA e o pacote anticrime... salve apenas sua dignidade pessoal enquanto pode".

O mundo da política é um mundo podre. Moro sabia disso, melhor que todo mundo. Condenou os grandes jogadores desse jogo de xadrez. Mas a sua vaidade o fez entrar nesse mundo imundo. Hoje não pode atuar como queria, pois o presidente, seu patrão, está fazendo de tudo para defender o filho bandido. Mudando a direção da PF do Rio de Janeiro, mudando membros da Receita Federal, sancionando o juiz de garantias, mudando o COAF e até o nome do órgão e em conluio com o presidente do STF conseguiu que não se investigasse seu filho.

Não estou escrevendo esse texto com prazer. Pelo contrário, com profunda tristeza. Em ver aquele em quem inicialmente acreditei, em que o mundo acreditou e que ainda milhares acreditam, apesar do descrédito diário, que ele, Sérgio Moro, seria o grande herói do judiciário brasileiro, superando Joaquim Barbosa e o jurista Rui Barbosa, mas vejo nitidamente o seu opróbrio, sua queda e sua humilhação.

A história de Sérgio Moro me lembra um herói bíblico que também tinha o cargo de juiz. Sansão era um homem forte, respeitado e poderoso, mas por causa da vaidade e do seu pecado morreu com os dois olhos furados, num templo pagão filisteu.

Triste demais alguém começar a sua carreira como Herói e juiz incorruptível e terminar como juiz iníquo, parcial e sem poder.

Antigamente suas sentenças eram ouvidas, acatadas e cumpridas. Hoje, sua voz se cala e não pode destoar de seu patrão.

Seus poucos dias como "Superministro da Justiça” estão contados. Seu sonho de ser ministro do STF é só uma utopia distante. O que permanecerá é a saudade do seu cargo de outrora: um simples juiz federal que se tornou herói nacional!




[1] Artigo escrito em 27/08/2019, com o intuito de refletir sobre a vida de Sérgio Moro, o herói nacional, que abandonou 22 anos de Magistratura, um cargo que tinha vitaliciedade, para se tornar ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, com promessas de assumir uma cadeira no STF.

sexta-feira, 9 de julho de 2021

A origem do processo de impeachment no Brasil e no mundo?[1]

 


            O termo impeachment significa “impedimento” e apareceu pela primeira vez na segunda metade do século XIV, já nos fins da Idade Média. Em 1376, o Lord Latimer foi alvo de um processo da Câmara dos Comuns (Parlamento Inglês), o que se configurou como o primeiro processo de impeachment do mundo. Nesse processo, foram definidos os primeiros trâmites que seriam aperfeiçoados no decorrer dos séculos.

            O procedimento de impeachment no Brasil, também referido como impedimento ou destituição, é regulado pela Constituição Federal, regulamentado pela lei 1.079/50, que, em seu artigo 2.º, estabelece atualmente o período máximo de cassação em oito anos. Outros documentos importantes desse processo são as normas regimentais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

            O processo de impeachment pode ocorrer com os ocupantes de cargos no Poder Executivo (Presidente, Governadores e Prefeitos), também podem sofrê-lo Ministros de Estado e Ministros do Supremo Tribunal Federal.

            Desde 1945, cinco processos de impeachment foram abertos contra Presidentes da República.

            O primeiro contra Getúlio Vargas em 1945, foi rejeitado pelo plenário da então Câmara Federal. O segundo contra Carlos Luz, e o terceiro, contra Café Filho, ocorreram em 1955, se concretizaram-se de maneira veloz, sem direito de se defenderem.

            Já o quarto foi contra Fernando Collor, afastado da presidência em 2 de outubro, julgado pelo Senado em 29 de dezembro de 1992. Como último recurso para preservar os direitos políticos, Collor renunciou ao mandato antes do início do julgamento, mas a sessão teve continuidade. Foi condenado à perda do cargo e a uma inabilitação política de oito anos pelo placar de 76 votos a 5, numa sessão presidida pelo ministro Sydney Sanches, presidente do Supremo Tribunal Federal.

            O quinto processo de impedimento presidencial ocorreu contra a presidente Dilma Rousseff, resultando na cassação de seu mandato, mas seus direitos políticos foram preservados. A manutenção de seus direitos políticos é uma clara afronta à lei de impeachment, só ocorreu porque o processo contra ela baseado nas “Pedaladas Fiscais” foi extremamente contestado e visto por muitos como “Golpe”, pelo fato de outros presidentes, inclusive seu vice, Michel Temer, tê-lo cometido quando a substituiu no período do seu mandato.

            A diferença entre os casos de Luz e Café e os de Collor e Dilma é que nos episódios de 1955 não se seguiu a Lei do Impeachment (Lei 1.079/1950). Os deputados e os senadores entenderam que a situação era extremamente grave, com risco de guerra civil, e finalizaram os julgamentos em poucas horas, sem dar aos presidentes o direito de se defenderem na Câmara e no Senado.

            Existem dois tipos de processos de impeachment para presidente da República no Brasil. Um mais conhecido é o que o Senado Federal é o julgador do processo. Esse ocorre quando acontecem crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente da República.

            O outro ocorre quando o presidente da República comete crimes comuns e o Procurador Geral da República (PGR) entra com uma ação no STF. Ao aceitar a ação e indiciar o presidente à Câmara dos Deputados, deve autorizar ou não o prosseguimento da ação. E o julgamento quem faz é a corte do STF com seus 11 ministros. Não é o Senado Federal.

            No próximo texto eu explico detalhadamente como ocorre cada um desses processos, do início ao fim.

 





[1]Texto escrito em 28/04/2020, com a finalidade de historicizar o processo de impeachment. Mostrando toda sua trajetória e principalmente relatando quais presidentes brasileiros passaram por ele e quais perderam ou não o mandato.

Você sabe como funciona o processo de impeachment no Brasil?

 

             O pedido de impeachment pode ocorrer quando o chefe do Poder Executivo comete crimes de responsabilidade baseado no Artigo 85 da Constituição Federal, que relata quais seriam estas condutas criminosas.

            Qualquer cidadão com pleno direitos políticos, se considerar que o presidente da República cometeu crime, pode entrar com o pedido de impeachment. Desde que o mesmo seja devidamente fundamentado, por escrito e com as provas anexadas. Esse pedido deve ser encaminhado à Câmara dos Deputados, com a tipificação do crime cometido. Se o presidente da Casa achar que procede, ele aprova o pedido e solicita a formação de uma comissão especial para analisar a denúncia.

            Essa comissão é eleita dentro da Câmara com sistema de chapa única. A comissão deve ter 65 deputados de todos os partidos da casa. Formada a comissão, a Câmara notifica o presidente.

            A partir dessa notificação o presidente tem um prazo de 10 sessões plenárias para se defender. Com a defesa e pedido em mãos a comissão tem um prazo de 5 sessões para dar um parecer informando se recomenda ou não que o processo continue.

            Esse parecer tem 48 horas para ser votado pela Câmara dos Deputados. Para levar o processo adiante precisa de 2/3 dos deputados, ou seja, 342 votos favoráveis. Se esse número não for atingido o processo deve ser arquivado e o presidente segue governando. Porém, se o parecer for favorável, o processo segue para o Senado Federal.

            No Senado, os trâmites são parecidos, é formada uma comissão que tem dez dias para emitir o parecer. Esse parecer também precisa ser votado. Para a aprovação ou rejeição precisa de maioria simples do senado, ou seja, 41 votos de 81 senadores. Se a maioria for contra o processo, ele é arquivado. Se a maioria for a favor, ele segue para julgamento.

            Nesse caso, o presidente é afastado do cargo por 180 dias e o vice assume o posto interinamente. O julgamento é conduzido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal que ouve as testemunhas e elabora um relatório da denúncia. Haverá uma nova votação para aprovação ou não do impeachment por 2/3 da Casa, ou seja, 54 senadores. Não havendo essa maioria o presidente é absolvido e retoma o cargo. Mas, se 2/3 votarem a favor do impeachment, o presidente é condenado e perde definitivamente o cargo e seus direitos políticos por 8 anos, sem poder ter cargo público.

            O vice assume em caráter definitivo e será o novo presidente da nação. Se o vice também for impedido dependerá do período do seu afastamento. Se ocorrer nos dois primeiros anos do mandato presidencial, ocorrerão eleições Diretas, o povo vai às urnas novamente eleger um novo presidente da República. Mas se ele for afastado após dois anos de mandato, as eleições serão indiretas com voto dos parlamentares.

Enquanto as novas eleições não ocorrem é o presidente da Câmara dos Deputados quem governará o país.

 

Obs.: No caso do impeachment de Dilma Rousseff, o Ministro Ricardo Lewandowski que presidiu a sessão no Senado Federal e o presidente do senado Renan Calheiros, após a condenação, inventaram outro julgamento em relação à perda dos direitos políticos da presidenta, fazendo uma gritante ilegalidade, pois a condenação por 2/3 dos senadores, além de ter o poder de retirar o presidente da República do cargo, também retira seus direitos políticos.

Esse segundo julgamento que não está previsto na Lei do Impeachment e nem na Constituição Federal, deixou nítido que as “Pedaladas Fiscais” não foram motivo suficiente de retirá-la do poder, menos ainda, de retirar seus direitos políticos por 8 anos.

 

Obs.: Lembrando também que o processo de impeachment é, antes de tudo, um processo político, por isso ele nunca ocorrerá com um presidente com altíssima popularidade. Só ocorre com a baixa popularidade e uma forte campanha midiática contra o Chefe do Executivo. Isso, obviamente, ocorreu com os presidentes Collor de Melo e Dilma Rousseff.

Nota: Segundo texto sobre o impeachment, escrito também em 28/04/2020, com a finalidade de mostrar como funciona todo o processo de impeachment do início ao fim.